A HISTÓRIA DO LORENA GT


León "Lorena" Larenas Izquierdo nasceu em Viña del Mar, no Chile, em 1922, e antes da  Segunda  Guerra deixou sua cidade para estudar nos Estados Unidos (em algumas revistas brasileiras era apresentado como espanhol).

Queria ser piloto de avião, fez curso, prestou serviço numa base aérea e depois foi trabalhar em linhas comerciais. Após a guerra, empregou-se numa empresa de Miami, Flórida, para construir bancos para aviões DC3 e DC4. Ali aprendeu o processo de trabalho em fibra de vidro. Os bancos fabricados por esta empresa foram utilizados para equipar os aviões DC3 da empresa aérea brasileira "Panair do Brasil", doados pelos Estados Unidos aos países sul americanos como "sobras de guerra".

Trabalhando na empresa americana "Ferrer Motors Corporation" (4000 N.W. 25th Street, Miami, Florida), de propriedade de Frank Ferrer, que anteriormente fabricava os bancos para aviões, León acompanhou a criação do automóve “Ferrer GT - veja página sobre o Ferrer GT.

Este automóvel, vendido completo ou na forma de "Kit-Car", foi um dos primeiros a ser ofertado nesta forma  nos USA, sendo um dos iniciantes da moda de carros esportivos em kit, inicialmente montados sobre mecânica Volkswagen.


          

Em 1966 León veio para o Brasil, e passou a trabalhar na empresa "Estructofibra" de propriedade do empresário João Silva, presidente do Clube de Regatas Vasco da Gama, e em 1967 trouxe um Ferrer GT para servir de molde para a fabricação do carro no Brasil. Ele pretendia montá-la em chassis de Karmann-Ghia, com motor Volkswagen 1.600cc e vendê-la no mercado.

Uma carroceria foi oferecida gratuitamente para a instalação dos equipamentos Porsche e correr, fazendo divulgação da mesma, para a equipe "Colégio Arte e Instrução". Esta carroceria foi montada e adaptada na sede da recém criada fábrica de carrocerias de fibra de vidro Estructofibra, em uma rua transversal à Av. Brasil, no Rio de Janeiro, tendo sido sua primeira corrida na "Primeira Etapa do Campeonato Carioca de Automobilismo" de 1968.

Na "Estructofibra", foi fabricada apenas uma carroceria, e no início de 1968 os moldes forma transferidos para a empresa "Fibraplastic" de São Paulo, Rua Galvão Bueno, bairro da Liberdade, de Celso Cavallari e Anísio Campos.

A "Fibraplast" já havia trabalhado nos carros molde e nos três primeiro Malzoni e nos moldes dos Karmann-Guia da Dacon, e iniciou a fabricação das carrocerias, e o primeiro carro foi montado na concessionária Volkswagen Monumento, na rua Thabor, 491, Ipiranga, enquanto o Sr. León "Lorena" instalava a empresa "Lorena Importação e Comércio Ltda.", na Rua Miranda de Azevedo 1234 (o prédio ainda existe).

No final de 1968 os primeiros carros "Lorena GT" começam a ser vendidos, com lançamento oficial no "VI Salão do Automóvel" em São Paulo (23/nov à 08/dez/1968). Os carros eram oferecidos com motores 1.300, 1.500, ou 1.600, e podiam ser customizados ou terem sua mecânica melhorada, o que era feito na oficina de Chico Landi, na rua Afonso Brás.

Após negociações sem sucesso junto à Volkswagen do Brasil para o fornecimento da mecânica para os carros, 20 carros Sedan Volkswagen populares (Pé de Boi) são adquiridos para terem suas mecânicas utilizadas nos carros Lorena. São também produzidas carrocerias para venda avulsa sem mecânica.

Em 1969 León "Lorena" retira-se da empresa "Lorena Importação e Comércio Ltda" por problemas administrativos, e cria a empresa "Lorena S/A Industrial de Veículos", no mesmo endereço, e depois a empresa "Protótipos Lorena Carrocerias Especiais Ltda" na Rua João Moura 760 (prédio com 1.600 m2. No local hoje existe um posto de gasolina), dando continuidade à fabricação do Lorena GT.

No final de 1969 a "Protótipos Lorena Carrocerias Especiais Ltda" inicia a fabricação do Buggy "Lorena" paralelamente a produção do Lorena GT, e no início de 1971 encerra sua produção.

Na Rua Miranda de Azevedo 1234, em 1969, sucedendo a empresa "Lorena S/A Industrial de Veículos", estabeleceu-se a  "Tambatajá Veículos Ltda", que passou a produzir o Jipe Gaiato, desenvolvido na empresa anterior por Celso Cavallari.

Em 1970 chegou a ser iniciada uma negociação para a instalação de uma linha de fabricação do Lorena GT e outros veículos em Manaus, Amazonas. Para tal foi constituída pelo Sr. Leon Larenas a empresa "Amazonas Fiber Glass S. A.", mas o projeto não evoluiu.

No período entre 1977 e 1981 Helio Herbert Felisoni Junior, Jeferson e João Tati apos adquirir os moldes do Lorena GT montaram, 4 carros Lorena, mais uma carroceria, porém com o nome de "Mirage GT". É possível que tenham sido construídas mais uma ou duas carrocerias.

Em 2008, Luiz Fernando Lapagesse um apaixonado por carros de fibra, "garimpando" em São Paulo uma carroceria réplica de um Porsche 550, acidentalmente encontrou uma de Lorena. A carroceria nunca havia sido montada, estando intacta, sem furos apesar de necessitar um extenso trabalho de recuperação da fibra, face aos anos de abandono em que tinha permanecido. Faltavam os capos dianteiro e traseiro. Já com alguma experiência no trabalho em fibra de vidro, foi realizada a restauração da carroceria. Com o desenvolver do trabalho, surgiu o interesse em reproduzir a carroceria, tendo sido fabricadas entre 2008 e 2014 nove carrocerias.

Não é conhecido o número exato de carros Lorena GT produzidos. Um carro foi construído na Estructofibra, vinte carros foram produzidos a partir dos 20 Volkswagen sedans, e mais 10 a 15 carros foram montados sobre mecânicas fornecidas por compradores ou adquiridas avulsas. Em torno de mais trinta carrocerias foram fabricadas e vendidas avulsas, para serem montadas pelos próprios compradores. Certamente o número total de carrocerias e carros produzidos é inferior a 100 unidades. Pelo menos quatro carrocerias foram exportadas: uma para a Venezuela, uma para o Uruguai, e duas para a Argentina.

Os carros produzidos para uso nas ruas apresentam várias diferenças entre si. Isto se deve à produção do carro em pequena escala, quase que artesanal, sendo difícil encontrar-se dois carros idênticos. Também diversos carros foram montados pelos próprios compradores, após serem adquiridas apenas as carrocerias, tanto para competição como para uso nas ruas. É extremamente difícil se estabelecer quais os componentes originais de cada carro.


No período entre 1977 e 1981 foram ainda montados, a partir das formas originais, 4 carros Lorena, mais uma carroceria, porém com o nome de "Mirage GT". Os carros foram produzidos em São Paulo a partir dos moldes do Lorena GT, pela empresa "Indústria Comercio Plásticos Reforçados Mirage", de Helio Herbert Felisoni Junior e Jéferson  Os carros foram montados na "Auto Mecânica Monza", localizada na Rua Vergueiro junto ao trevo da Via Anchieta.

Existiu ainda pelo menos um carro com o nome de "Andorinha II", baseado no "Lorena GT". Não se sabe se foi um carro construído a partir de moldes, ou uma adaptação em uma carroceria Lorena. (veja "Mirage GT")

 


 

Entre 2008 e 2020, após a aquisição de uma carroceria de "Mirage GT" original, nunca montada, Luis Fernando Lapagesse produziu novos moldes, iniciando a produção do "Lorena GT-L" em Saquarema, Rio de Janeiro. (veja "Lorena GT-L"). Foram produzidas um total de 9 carrocerias no período. Em 2020 três carros e os moldes foram vendidos para Neder Santana, Guarapari-ES.

 

 


Outros veículos Lorena


No início de 1970, León "Lorena", após sua saída da empresa que fabricava os automóveis, criou a firma "Protótipos Lorena Carroçarias Especiais" iniciando a fabricação de um buggy.

Construído em fibra de vidro e montado sobre a mecânica Volkswagen, não possuía alterações na plataforma.

O buggy mais se parecia com um jipe, aproveitando ao máximo os componentes Volkswagen, e foram produzidos aproximadamente 10 unidades.

Veja reportagens sobre o Bug "Lorena"


 

No início de 1971 surgiu o projeto do "Lorena RM", quando o industrial Renato Melcher convidou Lorena para construir um veículo esportivo de 4 lugares. O protótipo foi construído na empresa "Plásticos Reforçados Renato Melcher" em Santo André, São Paulo.

Avaliado pela revista "4 Rodas" no seu número 137, de dezembro de 1971, seria produzido numa fábrica na Barra da Tijuca, Rio (Estrada da Barra, 160), para onde a firma deveria transferir suas oficinas. O modelo nunca entrou em fabricação seriada, permanecendo apenas no protótipo, cujo paradeiro é desconhecido.

Veja reportagens sobre o "Lorena RM"


 

 

Durante 1969, León "Lorena", dono da marca Lorena, retirou-se da empresa, a qual passou a chamar-se "Tambatajá Veículos Ltda" (Rua Miranda Azevedo, 1234, São Paulo, mesmo endereço).

A Tambatajá Veículos deu continuidade ao projeto existente, e  passou a fabricar o jipe "Gaiato", o qual utilizava a plataforma original Volkswagen.

Veja reportagens sobre o Bug "Gaiato"

 

 


Nota do site: o histórico acima foi revisto em agosto de 2012, após encontro com o Sr. León "Lorena" Larenas Izquierdo, idealizador e construtor do Lorena GT, em sua casa em São Paulo, no dia 08/agosto/2012.


Veja página sobre León "Lorena"

       

Depoimentos de pessoas que tiveram contato direto com o Lorena GT quando de sua fabricação

Mozart Martins Filho

"Em fins de 68, eu trabalhava na concessionária VW Monumento, que ficava no bairro do Ipiranga em São Paulo, tinha uns 18 para 19 anos, e fazia teste de rua com os carros consertados pela oficina antes da entrega ao cliente, além de outras coisas.

Quando apareceu um chileno, "seu León", com uma carroceria totalmente inovadora pra época, linha bem avançada, esportiva, todos na empresa ficaram maravilhados. Era o "LORENA GT" !!
Um dos sócios da revenda, era conhecido do chileno, que alugou um dos boxes da oficina,para montar aquele que seria o primeiro modelo de rua. O carro foi montado bem artesanal e as soluções eram testadas e adaptadas, usando peças de vários carros da época. León pagava o aluguel do espaço, além de um mecânico, um eletricista, tapeceiro e um funileiro que trabalhavam quase exclusivamente para o Lorena.

Cheguei a dar umas voltas com ele nas ruas do bairro para teste. O carro ficou totalmente pronto em uns 5 ou 6 meses.

Era branco, motor 1300 cc e adaptado depois para 1600. Quando começaram os pedidos, "seu León" alugou um grande galpão na zona norte de São Paulo, e montou uma equipe própria, para montagem em série (inclusive levando vários colegas meus da revenda).

Lembro que a Volkswagen não quis vender apenas o chassi e mecânica, barateando assim o custo, (como faziam com a Puma, também no bairro do Ipiranga), e León teve que comprar uns 20 fuscas "pé de boi" novos, para remover a carroceria e usar a parte mecânica.

Estas são minhas lembranças do Lorena GT. Carro muito bonito, bem baixinho, um barato !!"


"Infelizmente não tenho fotos ou qualquer documento relativo á época.

Só mais alguns detalhes: León costumava acompanhar de perto a montagem, tinha muita teoria para as adaptações, mas também ouvia os mecânicos que tinham mais prática.

Lembro que quando o carro já estava pronto, e ele já tinha alugado o galpão para dar seqüência a montagem em série, tentou com a ajuda da concessionária comprar direto da fábrica Volkswagen somente a parte mecânica (chassis/motor/cambio etc.) e a VW não concordou. Diziam na época que teve o dedo da Puma (seria seu concorrente é claro !) que trabalhou nos bastidores da VW para evitar o negócio.

Ele (coitado) foi obrigado a comprar os fuscas novos (básicos mais baratos chamados de "pé de boi") utilizando só a plataforma.

Depois que o Lorena foi pra sua casa própria que era do outro lado da cidade, as notícias foram sumindo até não saber mais nada. A concessionária VW Monumento ficava na rua Thabor, 491 pertinho do Monumento da Independência no Ipiranga (fechou as portas em 1996.)." Mozart Martins Filho

 

Celso Cavallari

"Este foi um período agradável de minha vida. Em 1969 eu tinha apenas 31 anos e me sentia um super-homem, indestrutível e imortal.

O Sr. León Lorena foi-me apresentado pelo Chico Landi que o trouxe até minha fábrica, Fibraplastic, na Rua Galvão Bueno, no bairro da Liberdade em São Paulo, para encomendar a moldagem das carrocerias. A minha empresa era a única que fazia tais serviços na época. Meus clientes de carrocerias completas foram, Malzoni, Dacon entre outros.

Nos primeiros contatos que tivemos, em abril de 68 se não me engano, ele me trouxe uma carroceria sem acabameto (gelcoat vermelho) que, dizia ele, fora importada dos EUA. Sobre tal carroceria fiz os moldes para as futuras peças que foram todas moldadas na Rua Galvão Bueno. Desconheço que outra empresa hovesse moldado este carro.

Como o Sr. León não tinha dinheiro para pagar o serviço, ele se associou com um grupo de pessoas sob a liderança de um certo Sr. Rubens Gugliometti. Comecei a fazer as carrocerias encomendadas. Enquanto isso o grupo citado alugou um imóvel na Rua Miranda de Azevedo, Pompéia, que era uma antiga fábrica de artefatos de fibrocimento da Casa Sano. Lá as carrocerias foram acabadas.

Fui convidado para gerenciar a montagem dos veículos e foram produzidos talvez uns doze deles. Como o projeto (original) era muito amador, o acabamento ficava comprometido. Estive nesta empresa durante três meses e saí quando encerraram as atividades. O Sr. León já não fazia parte da sociedade quando esta foi encerrada.

O tal do bug Gaiato (link para a página) foi criado e projetado por mim, e construído um veículo experimental em apenas 15 dias, para atender o pedido da diretoria, que queria um produto para oferecer ao Exército. Minha preocupação neste projeto era custo e forma-função sem nenhuma preocupação estética. Havia um outro protótipo em execução, com correções necessárias, que nunca foi as ruas, apesar de a revista Quatro Rodas ter divulgado a noticia e um esboço da carroceria.

A Lorena (não confundir com o Sr. León Lorena) comprou sim 20 Volkswagem (modelo pé de boi) para ter a mecânica onde montar os Lorenas GT. Destes vinte volks, dez foram vendidos ainda completos, pois a empresa estava em dificuldades. O "viejo" León era um tipo adorável e inesquecível, e apesar de todos os exageros eu, particularmente, me
entendia bem com ele. O fato é que ele foi posto fóra da sociedade devido alguns problemas e após sua saída, estabeleceu-se em uma sociedade com alguém que não conhecí e começou a moldar um bug copiado do Vagabond da Fiberfab (link para a página). Ele morava na Rua João de Moura e acho que o endereço citado como o da empresa "Protótipos Lorena e Carrocerias Especiais Ltda." era do seu apartamento.

O L2 (Lorena GT 2+2) cuja foto é a primeira do Jornal do Brasil de 25/6/69 (link para a reportagem), eu já não me lembrava mais, chegou ao ponto de ser moldado exatamente quando pedi a conta da Lorena, após o Sr. Rubens, presidente da Lorena, me convidar para ser o novo presidente da mesma! Deu para entender? Me lembro de alguns sócios capitalistas como o Renato, o Reynaldo e o Carlos Alberto Bueno Neto que estavam descontentes (muito) com a gestão do Rubens. Eu que havia algum tempo já não era remunerado, também estava descontente resolvi parar e cuidar da minha vida.

Soube que estavam negociando com outras pessoas a empresa mas não as conhecí. Após uns dois anos um certo Napoleão encontrou-se comigo na Avenida Vautier em SP para saber se eu queria completar o projeto do L2, que recusei, pois não tinha mais tempo para aventuras.

Finalmente, ví o León e família em 1974 (creio) que então era vizinho de um conhecido meu, o Billy. Ele (o León) parecia feliz e me contou que tinha uma fábrica de pias de fibra de vidro. Aparentava estar bem de vida, e apesar de suas dificuldades, foi uma das pessoas mais interessantes que conheci.

Observação:
Na minha fábrica, Fibraplastic, nasceram os GT Malzoni, cujos moldes e quatro carrocerias foram vendidas para a Vemag, e os moldes e carrocerias dos KG Dacon, no período que vai de 1964 até 1969."

Celso Cavallari
(o texto acima foi editado a partir de vários e-mails trocados com o Celso. Celso Cavallari faleceu em 30 de janeiro de 2017)


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